segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Cultura Cervejeira II


Loiras, morenas e ruivas
Publicado em 26/09/2010
Larissa Jedyn - larissa@gazetadopovo.com.br

Elas entendem tudo de cerveja. Da produção à degustação, passando pela incrível capacidade de combinar a bebida aos mais variados tipos de gastronomia, as mulheres reassumem o posto de cervejeiras de respeito.

“Dê-me uma mulher que goste de cerveja e eu conquistarei o mundo.” O último imperador alemão e rei da Prússia Kaiser Wilhelm II, que proferiu a frase no começo do século passado, parece não ter tido muito êxito na sua empreitada. Não arranjou uma companheira nas características desejadas, perdeu o império e as mesas regadas à cerveja se mantiveram rodeadas quase que exclusivamente por homens. E isso por muito tempo. Mas não é que depois do mercado sem fronteiras e das revoluções por minuto promovidas pela internet, muitas mulheres começaram a deixar de lado suas taças com a bebida de Baco para deleitarem-se com a mistura fina de malte e lúpulo?

Mas nem pense naquela cerveja servida estupidamente gelada, tomada a seco num
copinho sem graça, cujas latinhas viram pilhas depois do churrasco de fim de semana e que, finda a bebedeira, se revertem numa sensação desagradável de estufamento e uma louca vontade de ir ao banheiro. Cerveja de mulher é outra coisa, avisa a mestra cervejeira Suelen Presser, 27 anos. “Mulher é detalhista, gosta das coisas bem feitas e a bebida ideal precisa ter um algo a mais. A cerveja pega a mulher pela beleza da cor, pelo aroma, pela complexidade do sabor. Tudo isso aumenta o prazer na hora de beber, sem contar a arte da harmonização, que abre um universo de possibilidades”, comenta ela, que é sócia do marido na Klein Bier, e recomenda a sua Stout, que é amadeirada e tem notas de café e chocolate, como companhia para uma fatia de queijo brie ou de torta de frutas vermelhas.

A sua história com a cerveja começou há quatro anos. “Um dia meu marido chegou empolgado com umas cervejas diferentes, artesanais e com a ideia de começar a produzir em casa. Eu que sempre fui cervejeira abracei a causa. E lá fui eu para o fogão, grávida do meu segundo filho, moer malte, fazer rampa de temperatura... Estávamos tão empolgados que não conseguíamos esperar a cerveja ficar pronta. E, paralelamente a isso, fomos bebendo nossa pesquisa de mercado”, diverte-se Suelen, que acompanhou bravamente o marido na rota das cervejarias em Santa Catarina. “Somos profissionais já há dois anos e a nossa produção é de quatro mil litros/dia”, comenta.

Sobre saltos altíssimos e maquiagem impecável, Suelen intercala os comandos ao mestre cervejeiro e ao filho mais novo, que clama para aparecer na sessão de fotos da mãe. “Essa arrumação toda é só para a foto, viu? Se você viesse aqui ontem veria a correria em que estou metida todos os dias. Mas não reclamo, não”, diz ela, enquanto experimenta uma de suas cervejas para a foto. “E sabe o que é melhor? Cerveja não engorda! Ela tem um componente antioxidante que ajuda a manter o corpo em ordem. Só tome cuidado com a cerveja de trigo – que é mais calórica. E ainda há estudos que apontam para as propriedades médicas do lúpulo, que seria calmante, ajudaria na prevenção do câncer de mama, de útero e na calvície”, comemora. Mas, atenção, a medida para tirar proveito dessas características é só um copo de cerveja por dia.

Enquanto explica cada processo da produção da bebida, Suelen deixa escapar que está desenvolvendo uma cerveja só para mulheres. O que ela tem de diferente? “É uma porter, de alta fermentação, com um toque de chocolate. O nome será A Estivadora. E por falar nisso, tudo já está devidamente registrado, viu?”, diz ela, enquanto apresenta a linha completa da Klein: Pilsen de receita alemã, a Pilsen Tchec, com receita tcheca; a Brown Ale, que é mais caramelada; a Stout, que é escura e mais amadeirada e a Waiss, de trigo. “Dessas, a minha menina dos olhos é a Tchek, mais amarga e mais encorpada, o que equilibra o amargor. Mas para quem está começando a enveredar pelo universo da cerveja, a mais indicada é a Weiss, que tem um sabor de cravo e banana.”

Arte feminina


A propósito, a cerveja nos primórdios era feita por mulheres. Segundo a Larousse da Cerveja, de Ronaldo Mo­­­rado, a produção da cerveja era uma atividade caseira, assim como fazer pão e cozinhar. Quando os homens saíam para caçar ou trabalhar, as mulheres iam para a cozinha e, com os mesmos ingredientes, produziam pão e cerveja ao mesmo tempo. O domínio feminino na produção da cerveja só diminuiu no fim do século 18, quando o negócio da cerveja despertou a presença masculina e grandes empresas surgiram, iniciando-se a produção em grande escala. Elas só reassumiram o papel na cultura cervejeira durante a Primeira Grande Guerra, quando os homens foram para os campos de batalha e alguém precisava produzir a bebida, e agora, com a nova safra de mulheres cervejeiras.

A engenheira civil, Sabrina Guedes, 26 anos, está se iniciando na prática. Ela sempre gostou de cerveja, mas a bebida estava longe de ser a sua preferida. Isso até descobrir um curso de harmonização de cervejas gourmet. “Fiz o curso com o meu marido e nos apaixonamos pelas combinações! Nunca tinha imaginado beber cerveja num jantar mais elaborado, ou ainda acompanhando a sobremesa! Daí em diante começamos a pesquisar sobre cervejas importadas e artesanais”, conta ela, que acabou fazendo um curso de produção de cerveja na Bodebrown, com outras colegas mulheres na turma. “Estamos na nossa quarta cerveja produzida em casa, duas do tipo Brown Ale, uma ESB (English Special Bitter) e uma Blond Ale. Fizemos em torno de 20 litros de cada. Parece muito, mas acaba rápido e sempre faz sucesso com os amigos. Já temos até encomendas”, comenta. Entre suas preferidas está a Wee Heavy, uma Strong Scoth Ale, produzida pela Bode Brown e a Green’s Discovery, uma cerveja pilsen sem glúten, extremamente leve, que experimentou na Mercearia Coralina.

Colocando em prática seus conhecimentos de harmonização, Sabrina indica combinar cervejas de trigo, como a Estrella Damm Inedit, com peixes. Para sobremesas com chocolate, um boa companhia é a Colorado De­­moiselle, uma cerveja escura (Porter) produzida em Ribeirão Preto, que leva café em sua composição.

Fonte: http://www.gazetadopovo.com.br/viverbem/conteudo.phtml?tl=1&id=1050521&tit=Loiras-morenas-e-ruivas
Foto: Daniel Castellano/ Gazeta do Povo

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