
O cervejeiro Ronaldo Morado lançou, em Belo Horizonte, a Larousse da Cerveja, um livro inteiramente voltado para a popular bebida. Nos próximos meses, o autor irá divulgar o livro em diversos bares da capital. O mineiro conta que teve a idéia de escrever a enciclopédia sobre o assunto quando percebeu que, apesar de muito popular na mesa de bar, a cerveja não era freqüentadora assídua das estantes. E não era por falta de conteúdo. Em três anos de pesquisa, Ronaldo reuniu dados, estatísticas e curiosidades sobre a história da cerveja, seu processo de fabricação, suas características, os diferentes estilos e seu consumo. Confira a entrevista com o autor:
Não é um pouco irônico que no Brasil, onde a cerveja é tão popular, não exista nenhuma publicação sobre o assunto?
Sobre isso, existem duas informações importantes. A primeira é que o Brasil não é um grande bebedor de cerveja. A Venezuela bebe quase o dobro que nós, per capta. O Brasil bebe, anualmente, 50 litros per capta, e a Venezuela, 90 litros. A Alemanha bebe 200 litros. Então, não somos um grande consumidor de cerveja. Em segundo, essa falta de livros e publicações é um fenômeno mundial. Existem pouquíssimos livros em língua espanhola e francesa, mesmo em língua inglesa, sobre cerveja.
Porque esse mercado de livros não cresceu, como o que aconteceu, por exemplo, com o vinho?
Existem varias hipóteses, eu mesmo fico sem saber. O vinho é uma bebida fantástica, tem um espaço gastronômico conquistado desde a época das monarquias. Ele sempre foi uma bebida da mesa, sempre ligado à gastronomia, e nos últimos anos a gastronomia teve um salto muito grande de sofisticação e de globalização. Há 20 anos eu ainda não sabia o que era um sushi, aí veio essa onda de experimentar comidas diferentes, e começou esse movimento da cozinha ser um local até chique. Hoje há casas em que o local mais privilegiado é a cozinha, e o vinho pegou carona nessa onda. Com a sofisticação do paladar, o vinho foi junto. A cerveja sempre teve um outro espaço.
Os apreciadores do vinho têm um ritual na hora de bebê-lo. Existe este mesmo ritual com os cervejeiros?
Você pode dar o mesmo tratamento ao vinho, ao café e a várias bebidas. Existem muitos especialistas que tratam a cerveja com o mesmo ritual do vinho, nesse aspecto na degustação. Eu acho que o espaço da cerveja é diferente. A característica da cultura cervejeira é mais da celebração, da confraternização, ela se presta mais a um ambiente alegre, e menos a esses ambientes que tendem à sofisticação.
Os cervejeiros correm o risco de se tornar os ‘’chatos de buteco’’?
Acho que não, a não ser que a pessoa já seja naturalmente chata. Se você está numa mesa de bar falando de futebol ou política e começa a falar de cerveja, é um assunto que cabe. Não cabe você ficar discutindo a safra de um vinho, sendo que você está tomando cerveja. É um assunto alegre, e são 81 estilos que nós conhecemos muito pouco. Nós conhecemos praticamente a pilsen.
Falando em pilsen, ela é a preferência nacional. Você acha que a ela pode perder a liderança no mercado brasileiro?
A pilsen não é só a preferência nacional. A “lora” que nós conhecemos é preferência mundial. Quase 80% do mercado mundial é dominado por esse tipo de cerveja. Eu acho que tem espaço para ter muito mais oferta de estilos no Brasil, mas um estilo se tornar tão popular quanto a pilsen é quase impossível. Mas existe espaço, por exemplo, para que os restaurantes tenham uma carta de cerveja. Existe um bar na Bélgica, o Delirium Tremens, que oferece 2.400 cervejas no cardápio. Claro que isso é um exagero, mas é bom ter opções. Em BH já tem bares com oferta de até 200 cervejas diferentes.
Em alguns lugares, existem cervejas com sabores. Quais os mais inusitados que você já viu?
Já vi cerveja sabor coca cola, limão e laranja. Mas há uma diferença. Tem um estilo de cerveja, que quando está na fase final de fermentação, é acrescida de alguma fruta, pode ser framboesa ou cereja, por exemplo. São as cervejas de fruta. É preciso cuidado para não confundi-las com as cervejas que misturam refrigerante de cola, limão, laranja. Isso é uma novidade, uma coisa que eu considero até meio estranha. Mas tem gosto pra tudo.
Quais são os países mais proeminentes quando se fala se cerveja?
Em termos de volume de produção, China, Alemanha, Estados Unidos e Brasil. Em consumo per capta, República Tcheca, Alemanha, Irlanda e Luxemburgo. E em diversidade de estilos, a Belgica é o pais por excelência com o maior numero. Dos 81 estilos, na Bélgica você tem uma chance muito grande de encontrar todos. Me arrisco a dizer que você não encontra isso em nenhum outro país do mundo.
Porque os países europeus estão na dianteira, quando se fala em consumo?
É a tradição. Até o século XIX, a cerveja era um alimento, servido no café da manhã. Da mesma maneira que as mulheres faziam o pão, elas faziam a cerveja. Inclusive os ingredientes da cerveja são os mesmos do pão. Em muitas regiões a cerveja ainda é tomada como alimento.
No Brasil, quando a cerveja começou a ficar tão popular?
No Brasil, a cerveja sempre foi popular, aqui é um país tropical. Mas nos últimos dez anos está acontecendo um movimento muito importante, de microcervejarias e de cervejas caseiras. No último concurso nacional de cerveja caseira que tivemos, aqui em BH, foram mais de 150 inscritos e chegou um ponto em que o pessoal não aceitava mais inscrição. A própria BH é um importante pólo de cultura cervejeira no Brasil. Aqui temos oito excelentes microcervejarias, pequenos empreendimentos, excelente atividades empreendedoras. Nós somos a capital brasileira dos butecos, temos um pólo interessante de microcervejaria e temos também a maior concentraçãode cervejarias caseiras do Brasil.
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